MOÇAMBIQUE: desordem, perturbação, caos e incerteza

Se hoje tivéssemos que definir em uma palavra o que se passa em Moçambique, teríamos muita dificuldade em eleger aquela que representa melhor a actualidade.
No plano político, com ramificações óbvias nas outras vertentes -sociais, económicas e militares- paira alguma incerteza quanto ao tipo de direcção que os planos de paz vão seguir, após a morte do líder histórico da RENAMO, Afonso Dhlakama.
O líder interino Ossufo Momade (um parlamentar e general na reserva), decidiu transferir a sua residência para a Serra da Gorongosa, região onde Dhlakama vivia e a estabeleceu como último grande bastião da RENAMO.
Este novo passo, perpetrado pela comissão política nacional do principal partido da oposição, pode não ser motivo para alarme, mas gera claramente muitas interrogações no desenvolvimento de um acordo de paz definitivo para o país.
É verdade que o parlamento moçambicano já entrou num consenso quanto ao novo projecto de revisão da Constituição que vai permitir uma maior descentralização, situação que, aliás, já estava a ser debatida pelo Presidente Nyusi e Dhlakama. Todavia, ainda está muito em jogo, designadamente o processo de desmilitarização da RENAMO e a integração das suas forças sob a égide da FRELIMO. O que fazer, por exemplo, com os militares que já não têm idade para serem integrados? O legado de Dhlakama não pode ser desperdiçado, mesmo sabendo que a sua RENAMO há muito está acostumada ao ruído das armas.
Quanto à presidência de Nyusi, ela está longe de corresponder às expectativas criadas. Embora, este enalteça que Moçambique está de volta aos "carris do progresso", o que acabamos por verificar é uma continuação perturbante dos mesmos vícios do passado que levam naturalmente à pobreza extrema do seu povo.
Na realidade, o que observamos é um desgaste e degradação das condições do país nos mais variados domínios. Ao contrário do que é propalado em vários sectores da sociedade, o quarto Presidente de Moçambique, não encontrou os cofres do Estado vazios. Nyusi encontrou cerca de 71, 5 biliões de Meticais em diversas contas bancárias de instituições públicas, que violando a lei não canalizaram os valores para a conta Única do tesouro. Este valor tem sido usado à margem do orçamento do Estado.
Mas, para além destes aspectos, onde o rigor das contas do Estado estão longe de serem rigorosas, deparamo-nos com outros contextos perturbantes, designadamente a crise económica que originou cortes na saúde, educação, agricultura e o facto de ainda não terem sido responsabilizados os agentes do Estado que endividaram ilegalmente o país. O combate à corrupção tem ainda um longo caminho por percorrer.
Alarmante também são os ataques, que agora tem sido constantes, efectuados na província mais a norte de Moçambique - Cabo Delgado. Grupos radicais islâmicos, alegadamente associados ao al shabaab e outros extremistas estão a espalhar o caos e o terror. A sua origem provém de outros estados africanos a norte de Moçambique (RDC e Tanzânia), e nota-se que o seu grau de violência tem vindo a aumentar, (o número de mortos e deslocados aumentou consideravelmente nos últimos tempos) e uma vez que as forças governamentais ainda não tomaram medidas céleres, adequadas e eficazes, a população decidiu fazer algo por si: policiamento comunitário e auxílio na investigação policial.
Claro que isto não é a solução ideal. Esta situação já se perpetua há 8 meses, e apesar das autoridades provinciais terem manifestado palavras de conforto e assegurem que a segurança dos cidadão prevalecerá, os últimos acontecimentos não fazem antever uma resolução num curto prazo.
Estes grupos radicais vivem principalmente fruto de redes de comércio ilegal, e procuram cativar os jovens pobres e desempregados que não se conseguem integrar na linha mais moderada do islão.
De realçar que os investimentos em Cabo Delgado estão desenvolver-ser, visando fundamentalmente a exploração de gás natural, contando para isso com o empenho de algumas das principais petrolíferas mundiais.
Miguel Verde - Senior Consultant