CPLP: Já adulta, mas a precisar de mudar radicalmente

12-07-2018

A CPLP (comunidade dos países de língua portuguesa) conta com 22 anos, e é uma organização lusófona que está a passar por uma crise de identidade, eficiência que se traduz numa inacção confrangedora, quando mais não seja, nalgumas matérias.

Nos próximos dias 17 e 18 de julho vai ter lugar mais uma cimeira da CPLP na Ilha de Santa Maria em Cabo Verde. Para além daquilo que é tradicional debater nestes encontros - a língua e cultura, é sempre de esperar avanços significativos na economia, ciência, inovação e tecnologia que são aportes muito importantes para o desenvolvimento de cada país.

É de enfatizar que as finalidades gerais da CPLP são perfeitamente entendíveis, estando expostas por exemplo, no site do Instituto Camões, que foi criado tendo em vista a promoção da língua portuguesa, estando sob a superintendência do Ministério dos Negócios Estrangeiros português. Estas finalidades visam:

"A concertação político-diplomática entre seus Estados membros em matéria de relações internacionais;

A cooperação, particularmente nos domínios económico, social, cultural, jurídico e técnico-científico e a materialização de projetos de promoção;

A promoção e Difusão da Língua Portuguesa, nomeadamente a dinamização do Instituto Internacional da Língua Portuguesa.

A estes três grandes objetivos da CPLP pode-se acrescentar, como domínio prioritário e que tem vindo a assumir grande dinamismo, o da Cidadania e da Circulação de Pessoas".

Esta organização é actualmente composta por 9 membros: Angola, Brasil, Cabo Verde, Guiné-Bissau, Guiné Equatorial, Moçambique, Portugal, São Tomé e Príncipe e Timor-Leste. Como observadores associados, temos a Geórgia, Hungria, República Checa, Eslováquia, Japão, República Maurícia, Senegal, Turquia, Namíbia e Uruguai.

No próximo encontro entre os chefes de estado e governo, também deveremos assistir à admissão de 5 novos membros como observadores associados, todos eles europeus, cujos processos de candidaturas já estão concluídos - Reino Unido, frança, Luxemburgo, Itália e Andorra. Também o Chile e a Sérvia solicitaram a adesão, mas a sua admissão não está prevista para agora. De realçar também que a Organização dos Estados Ibero-Americanos (OEI) também deverá ser admitida, podendo-se assim definir um bom quadro de cooperação futura entre as duas organizações e, consequentemente, alargar a esfera de ação da CPLP.

Desta vez, o principal tema, que tem estado muito em destaque, essencialmente devido à migração em massa para a Europa, proveniente do norte de África é a mobilidade entre os países lusófonos. A livre circulação de pessoas e bens não é um problema novo e ao longo dos anos tem sido debatido a melhor maneira de ir solucionando esta preocupação geral, uma vez que há estados com limitações, pois pertencem a regiões distintas. Daí, que nesta temática sensível, tenham sido já tomadas algumas medidas, mas estas têm acontecido de uma forma muito faseada e cautelosa.

Primeiro, tivemos a supressão de vistos para os passaportes diplomáticos e especiais de serviço. A CPLP promoveu depois a facilitação de vistos para estudantes, e através de acordos bilaterais, vários países têm suprimido vistos entre si. Contudo, no âmbito multilateral, alguns países membros consideram imperioso promover um novo avanço, facilitando vistos para os empresários, agentes culturais e investigadores, entre outras classes profissionais.

O ponto de partida para esta discussão, baseia-se numa proposta conjunta de Portugal e Cabo Verde (que vai, entretanto, assumir a presidência) que incide na facilitação dos vistos de residência.

No caso de Portugal, é fundamental que este país tome a dianteira neste assunto, pois é evidente a sua vertente migratória (ultimamente com especial ênfase no Brasil e em Angola). Aliás, esta cimeira, deverá, tudo leva a crer, confirmar o embaixador português Francisco Ribeiro Teles como novo secretário-executivo da organização para o biénio 2019-2020, substituindo a atual secretária, Maria do Carmo Silveira.

Esta tem-se lamentado ao longo do seu mandato das várias limitações que a CPLP vem apresentando, não tendo podido muitas vezes agir de forma concertada e com autoridade em várias questões, muito em parte, devido a um dos princípios de não-ingerência nos assuntos internos de cada estado.

Além disso, a Secretária-executiva, realça também que os membros ao pertencerem a espaços geográficos díspares e a diferentes organizações regionais, ficam muitas vezes cerceados em exibir uma opinião concertada.

Mas isso, nem é o maior problema. Recentemente, um aspeto em que se viu uma completa inação, ou um "assobiar para o lado", foi na crise política ocorrida na Guiné Bissau. Os estados lusófonos poderiam e deveriam ter sido mais interventivos tanto nesta, como em outros episódios de caráter político e social. Aliás, a principal protagonista na Guiné Bissau, acabou por ser a organização sub-regional CEDEAO (Comunidade Económica dos Estados da África Ocidental), tendo inclusivamente aplicado sanções a vários políticos guineenses.

Uma outra situação que é alvo de muitas críticas, foi a admissão da Guiné Equatorial como membro de pleno direito na CPLP em 2014. Este país, embora tenha designado o português como língua oficial; ela simplesmente não é falada no território. Mas, muito mais grave, é a organização estar a pactuar com um regime totalitário, liderado pelo Presidente Teodoro Obiang (líder africano mais antigo - desde 1979), regime esse que é conhecido pelas constantes violações dos direitos humanos e por ainda não ter abolido a pena de morte.

Não podemos também deixar de qualificar como vergonhoso o acordo ortográfico que foi patrocinado pela CPLP. Aqui a cooperação parece ter funcionado. Porém, infelizmente, na nossa opinião. Este acordo que visa a padronização da língua portuguesa, acaba por "assassinar" a singularidade de cada país. É fundamental respeitar as culturas e costumes dos povos lusófonos.

Exaspera-se assim, por uma mudança de atitude da CPLP. Uma reforma institucional é obrigatória, se não queremos observar esta organização a definhar e a ganhar mofo!

Ao contrário de congéneres como a Commonwealth ou a Francofonia, a CPLP não tem a figura de suspensão ou de até expulsão dos Estados-membros. Isso é aplicado apenas a observadores.

A CPLP tem de ser mais ativa, e assumir posições mais contundentes. Os objetivos gerais estão bem patentes, todavia, a prossecução de tais objetivos, não parecem ser prioritários, ou são simplesmente ignorados e desrespeitados.

Face ao contexto actual, acreditamos que porventura está na altura de alterar os estatutos da CPLP de uma forma radical e efectiva, para esta não se tornar em mais uma organização sôfrega.

Miguel Verde

Miguel Verde - Senior Consultant
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